sábado, julho 08, 2006

Miracolo

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Ricardo Stabolito Junior

Se a Itália ostentava algum favoritismo para essa Copa, devia-se em muito (muito mesmo) ao peso de sua camisa. Com atuações fracas e sem energia, a Itália trilhou seu caminho até o Mundial da Alemanha levando consigo descrença e desânimo. Poucos eram aqueles que acreditavam numa Itália finalista, como se confirmou ontem.

A torcida italiana passava por uma fase de profunda depressão. A eliminação da Copa de 2002 nas oitavas-de-final contra a Coréia do Sul, tendo sido prejudicada por uma das piores arbitragens da história das Copas, e a descoberta do escândalo da compra de resultados no “Calcio” fizeram com que o torcedor praticamente “jogasse a toalha” antes mesmo do Mundial se iniciar.

A seleção italiana, mesmo encarando um dos grupos mais tranqüilos das eliminatórias européias (com Noruega, Bielorrússia, Moldávia, Eslováquia e Escócia), conseguiu se complicar em alguns jogos, como na derrota para os eslovacos ou na vitória sofrida contra os bielo-russos em casa por 4 a 3. No entanto, conseguiu se classificar com razoável folga no grupo, cinco pontos à frente dos noruegueses.

Nos amistosos de preparação, as atuações sem energia imperaram. O futebol italiano sempre foi estigmatizado como feio e pragmático, com foco no sistema defensivo e contando com o talento individual de seus atacantes. E, na preparação para essa Copa, o quadro parecia se repetir. Por ironia do destino, o único amistoso em que os italianos mostraram um futebol convincente foi contra a Alemanha, adversário da semifinal, goleando por 4 a 1.

A descrença do torcedor continuou com a convocação do técnico Marcelo Lippi. Muitos jogadores de times pequenos do campeonato nacional foram convocados. O Palermo, por exemplo, cedeu 4 jogadores. Além disso, muitos dos atletas convocados constituíam mais uma aposta arriscada do treinador do que uma certeza, caso de Gattuso, Materazzi, Zaccardo e De Rossi. A verdade é que a única certeza que os italianos tinham era quais eram seus adversários na primeira fase: República Tcheca, Gana e Estados Unidos – para muitos um possível segundo grupo da morte.

Complicava ainda mais o fato de os principais jogadores da seleção italiana já estarem próximos ou com mais de 30 anos de idade, sofrendo com problemas físicos e suscitando desconfiança entre os torcedores. Inclusos nesse grupo estão Cannavaro, Nesta, Del Piero e Totti (que quase ficou fora da Copa por causa de uma grave contusão).

Outro fator que poderia prejudicar a campanha da Itália era a indecisão do técnico Lippi. Desde que assumiu a Azurra, a não-repetição de escalações e mudanças de esquema tático sempre o marcaram. Durante os treinamentos pré-Copa, Lippi treinou o time em uma infinidade de formações, mas a imprensa italiana sabia que aquele comportamento muito mais se devia à indecisão do treinador do que pela versatilidade do elenco.

Na primeira fase, a Itália passou em primeiro lugar no seu grupo com sete pontos. Apesar de a chave ser complicada, a esquadra Azurra mostrou segurança e tranqüilidade na maioria do tempo. Com uma retaguarda bem postada e o goleiro Buffon em grande fase, os italianos sofreram um único gol (contra, por sinal). No entanto, a seleção teve duas baixas: Totti, jogando mal e pouco inspirado, foi para o banco e De Rossi, após uma cotovelada criminosa no atacante norte-americano McBride, foi expulso e suspenso por 4 jogos.

De Rossi era uma das apostas arriscadas de Lippi. O volante da Roma, apesar de ser bastante eficiente, é conhecido por ser violento e se exaltar facilmente. Para substituí-lo, Lippi passou a escalar outro jogador do grupo das “apostas arriscadas”: Gattuso. O volante do Milan é conhecido pelo seu jeito esquentado e briguento, mas consegue conferir ao time em que joga algo que a seleção italiana, apesar da boa campanha, ainda não mostrava – energia.

Nas oitavas-de-final, a Itália encarou a retranca eficiente dos australianos. Jogando com pouquíssima criatividade e dez jogadores o segundo tempo inteiro, o time esteve seriamente ameaçado pela desclassificação. Quando os australianos acertavam a mira (poucas vezes), Buffon estava lá. Já nos descontos, em uma ótima jogada individual de Fabio Grosso, a Itália conseguiu um pênalti duvidoso, convertido por Totti.

Contra a Ucrânia, nas quartas-de-final, o time fez um primeiro tempo muito bom, saindo com a vantagem de 1 a 0. No início do segundo tempo, sofreram forte pressão dos ucranianos, barrados novamente pelo inspirado Buffon. No contra-ataque, o artilheiro Luca Toni fez mais dois gols, selando a vitória italiana.

Contra os alemães, a Itália fez um jogo interessante. Com o retorno de Totti ao time titular, os italianos ganharam criatividade, mas continuaram pecando pela lentidão. Já os alemães mostraram bastante velocidade na saída para o ataque, mas faltava criatividade. No segundo tempo, a diferença entre os times se acentuou ainda mais – Itália tentando ficar mais tempo com a bola e esgotada fisicamente enfrentava a Alemanha muito rápida na subida ao ataque, mas muito mais displicente com a posse da bola. No final, um jogo que parecia destinado aos pênaltis foi decidido em um ótimo passe de Pirlo e em um chute ainda melhor de Fabio Grosso. Nos descontos da prorrogação, Del Piero ainda fez um segundo gol em um passe calmo e inteligente de Totti.

A Itália é um exemplo de um time que evoluiu na fase final, desde o jogo fraco contra os australianos até a atuação segura contra os alemães. Quem previu em algum bolão ou bolsa de apostas que a Itália seria finalista, deve ter ganhado um bom dinheiro, pois a maioria das análises antes e durante a Copa sobre a esquadra Azurra circulava por dois aspectos: a força de sua camisa e a fragilidade de seu time.

O fato de ter a melhor defesa dentre as seleções semifinalistas, tendo levado um único gol, rende elogios ao setor, que sempre é destaque dos italianos. Na falta de Nesta, machucado, a dupla que vem jogando é Cannavaro e Materazzi. O goleiro Buffon mostra a segurança de sempre em atuações brilhantes. Outro destaque é o lateral Fabio Grosso, que defende e apóia com segurança e propriedade, impondo velocidade rara aos ataques italianos.

Lippi parece ter se decidido quanto à formação do time. Ele vem jogando com duas linhas de quatro jogadores, Totti a frente da segunda linha armando para Luca Toni que joga isolado na frente. Mais do que isso, Lippi conseguiu a aprovação entre os torcedores e especialistas italianos, que eram em maioria descrentes quanto ao trabalho do treinador.

O que se conclui com a chegada na final dos italianos é que esse time venceu muito mais do que seus adversários nessa Copa. A Itália venceu também a desconfiança, descrença do torcedor, dificuldades técnicas e indecisões com um time mediano – um verdadeiro miracolo!


França finalista

A França fará a final da Copa do Mundo contra os italianos. Os franceses venceram por 1 a 0 Portugal, gol de pênalti de Zidane. Embora tenha feito o gol, Zizou foi bem marcado e fez apenas um bom jogo, brilhando em algumas oportunidades. Os destaques dessa vez foram a linha defensiva francesa – Sagnol, Thuram, Gallas e Abidal – que se apresentaram com segurança e encobriram quase totalmente as falhas proporcionadas pelo veterano goleiro Fabien Barthez, e o volante Patrick Vieira, que novamente fez um grande jogo, se firmando como o mais constante jogador da seleção francesa na Copa.

Portugal, por sua vez, mostrou uma de suas limitações: a falta de poder de fogo. Nenhuma das substituições do técnico brasileiro Luís Felipe Scolari para avançar o time conseguiram surtir efeito e proporcionar grande perigo aos franceses. O único que conseguia ser, esporadicamente, bem sucedido era Cristiano Ronaldo, apesar de suas peripécias. No sábado, os portugueses enfrentam a anfitriã Alemanha na disputa pelo terceiro lugar do Mundial.

quinta-feira, julho 06, 2006

A final

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Renato Bosi de Magalhães

Antes de começar a Copa do Mundo na Alemanha, a mídia esportiva apontava como favoritos ao título Brasil, Alemanha e Inglaterra. Alguns comentaristas citavam a Itália. A Azzurra entrava nesse rol mais pela tradição do que pelo futebol que vinha apresentando. Agravava mais a sua situação o escândalo das arbitragens que o país da bota vem passando, e que pode rebaixar times como Milan e Juventus. Pois bem, a Itália está na final.

A defesa comandada por Buffon e Cannavaro só tomou um gol. E não foi nenhum adversário que o fez, mas sim ela própria. No empate contra os Estados Unidos, o lateral Zaccardo marcou contra. Merecem destaque também os volantes Gattuso e Pirlo. O primeiro vem demonstrando a raça de sempre, com a vantagem de chegar sempre na bola e não no jogador, como às vezes acontece no seu time – o Milan. Já o segundo está sendo o grande armador da seleção italiana, posição que se esperava ser ocupada por Totti ou por Del Piero. A maioria dos gols italianos nesse Mundial passa por Pirlo. É de se destacar também o bom jogo coletivo da equipe comandada por Marcello Lippi. Dos onze gols marcados – melhor ataque, ao lado da Alemanha – apenas o atacante Toni marcou mais de um (dois). O restante foi convertido por jogadores diferentes.

Se a Itália não era considerada como uma das favoritas, menos ainda é seu adversário na final - a França. A equipe de Zidane começou muito mal a Copa do Mundo, empatando com Suíça e Coréia do Sul. A vitória sobre Togo por 2 a 0, com grande atuação de Vieira, levou o time às oitavas-de-final. A partir daí Henry e Zidane, que vinham apagados na competição, começaram a desequilibrar. Eu vinha sempre escrevendo que Trezeguet merecia uma vaga nesse time. Agora não sei mais. O esquema de cinco jogadores no meio está funcionando muito bem. Malouda e Ribery podem não se destacar com belíssimas jogadas individuais, mas são de suma importância taticamente. Eles sempre saem substituídos, pois as funções que eles exercem são muito cansativas. Eles devem marcar os laterais e ainda ajudar Zidane e Henry lá na frente.

E, por último, longe de ser menos importante, os zagueiros Thuram e Gallas e os volantes Makelele e Vieira, que fazem um Mundial impecável. Sobraram três titulares: Barthez e os laterais Sagnol e Abidal. Não gosto muito do goleiro francês. Ele não demonstra muita segurança, principalmente nas bolas chutadas de fora da área. Quanto aos laterais, são razoáveis defensivamente e fracos no apoio ao ataque. Enfim, nessa final Itália x França, não aponto um grande favorito, mas acredito que a seleção italiana vem com um pouco mais de força depois da vitória sobre os donos da casa.

E quem será o craque da Copa? Zidane? Cannavaro? Vieira? Buffon? Façam as suas apostas.

terça-feira, julho 04, 2006

Síndrome de Maradona

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Henrique Moretti

E a Argentina caiu de novo em Mundiais. E de novo caiu cedo, antes das semifinais. Para “los hermanos”, a mesma história se repete desde a Copa de 90, na Itália, quando, contando com Maradona (e principalmente naquele Mundial, com o “tapa-penales” Goycoechea), chegaram à final. Mesmo sem jogar bem, é verdade, mas chegaram.

A partir da competição em solo italiano a sorte argentina não é mais a mesma. Em 1994, obtiveram a classificação apenas na repescagem, contra a Austrália (com direito a derrota por 5x0 ante a Colômbia, nas Eliminatórias). Assim mesmo, estrearam com a banca toda contra a Grécia, num 4x0 com bom futebol e que marcaria o último gol de Diego Maradona com a camisa albiceleste. Como todos sabem, Dieguito caiu ao ser pego no dopping e a seleção também não resistiu, quando nas oitavas nem os gols de Batistuta adiantaram para parar a Romênia, de Hagi: 3x2.

Para o Mundial da França, de 98, a Argentina tinha um timaço. Verón, Ortega e Batistuta estavam no auge da forma. Redondo era outro que estava, considerado o melhor volante do mundo na época, mas o ex-atleta do Real Madrid ficou de fora da Copa por não se sujeitar às regras do treinador Daniel Passarella, que mandara os jogadores não usarem cabelos compridos. Apesar de tudo, o grupo fácil, com a companhia de Jamaica, Japão e Croácia foi um prato cheio para a equipe, que avançou tranqüilamente para enfrentar, e vencer, os arqui-rivais ingleses. O goleiro Carlos Roa surgiu bem nas cobranças de pênaltis para levar os argentinos às quartas-de-final, onde sucumbiram contra a Holanda, no finzinho do tempo regulamentar, num gol histórico de Dennis Bergkamp.

Na Copa de 2002 veio a maior decepção. A Argentina, de campanha impecável nas eliminatórias, apareceu como grande favorita ao título, junto à França. Ambas acabaram caindo ainda na primeira fase, e o time de Bielsa, que ainda tinha remanescentes de fracassos anteriores, como Batistuta, Caniggia e Veron, fez a torcida argentina chorar pela eliminação quando todos consideravam que aquela seria a grande chance. O grupo em que a seleção caiu também não ajudou: um dos mais difíceis da história das Copas, com Nigéria, Suécia e Inglaterra.

E agora, no Mundial da Alemanha, quando nossos vizinhos chegaram discretamente, de mansinho, e foram pouco a pouco construindo um favoritismo (chegando a encostar no Brasil nas casas de apostas), com boa vitória sobre as perigosos marfinenses, goleada sensacional de 6x0 sobre sérvios e virada no coração pra cima dos mexicanos.

Porém, novamente os argentinos sucumbiram, agora diante dos anfitriões alemães, numa partida muito disputada, em que até começaram bem, controlando o ímpeto inicial da Alemanha, que foi característico durante a competição. E ainda saíram ganhando, gol de Ayala, mas depois não souberam segurar o resultado. Pekerman efetuou substituições equivocadas e Klose empatou. A Argentina ainda teve o azar de perder o goleiro Abbondanzieri, machucado, quando o jogo ainda estava 0x0.

E nos pênaltis, o mesmo Ayala, talvez o melhor jogador argentino na Copa, desperdiçou a cobrança, como fez Cambiasso, fazendo com que a albiceleste voltasse pra casa mais cedo, de novo, ampliando o jejum de semifinais por mais quatro anos.

A verdade é que a Argentina parece estar vivendo uma “síndrome de Maradona”, como a que o Brasil viveu nas décadas seguintes à aposentadoria de Pelé, quando ficou por 24 anos sem títulos em Mundiais, de 1970 a 1994.

“Los hermanos” têm bons jogadores, bom ambiente, união, torcida que participa e incentiva, técnicos renomados, mas não conseguem chegar ao ponto máximo do futebol mundial como feito quando puderam usufruir do talento de Dieguito. Talvez seja em 2010, quando com Messi mais maduro, e melhor aproveitado, a equipe encontre um substituo à altura do antigo ídolo.

Enquanto isso o povo argentino, fanático, chora por mais uma eliminação precoce de sua seleção.


Ucrânia, zebra às avessas

A história das Copas do Mundo são marcadas por zebras. Nas competições mais recentes então, o aparecimento do mamífero listrado é mais constante ainda. Porém poucas vezes se viu uma surpresa com um futebol tão pobre quanto o da Ucrânia.

Shevchenko e seus companheiros foram a única seleção sem tradição a se infiltrar entre os oito primeiros da Copa 2006, onde todos os seis campeões mundiais participantes estiveram, mais Portugal, de Felipão.

Mas o futebol apresentado pelo país da ex-União Soviética não é digno de se figurar no rol dos oito mais de uma competição desse porte, já que em praticamente nenhum momento a Ucrânia apresentou alguma coisa, salvo no jogo contra a Arábia Saudita, quando goleou por 4x0. Mas, convenhamos, é a Arábia Saudita...

De resto, derrota acachapante sofrida para a Espanha, vitória polêmica diante da fraca Tunísia e triunfo nos pênaltis após um fraco 0x0 contra a Suíça.

O fato é que a Ucrânia chegou bem mais pela facilidade que apareceu em seu caminho do que por seus próprios méritos. É claro que os comandados de Oleg Blokhin não têm culpa disso, mas até então zebras como Turquia, Senegal, Croácia, Camarões e tantas outras mostraram bem mais futebol que os ucranianos.

Apesar de tudo, a estreante Ucrânia termina a campanha na Alemanha chegando já nas quartas-de-final, e o craque Shevchenko conseguiu deixar sua marca em redes de uma Copa do Mundo (duas vezes), mediante a outros grandes jogadores que nunca anotaram na maior competição do futebol do planeta, ou que sequer participaram dela. Valeu, Sheva!

Coluna também publicada em www.voleio.com

segunda-feira, julho 03, 2006

Brasil X França. A ressurreição do pesadelo

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Luiz Mendes Junior

(Texto escrito em 3 de julho de 2006)

Eis, amigos, a “encoberta” verdade sobre 1998! O grande segredo por trás de uma final de copa que suscitaria, pelo menos até anteontem, o imaginário de milhões de torcedores, incrédulos na legitimidade do futebol pífio apresentado por nossa seleção, convictos na existência de alguma trama escusa – possivelmente ligada à “suspeita” convulsão de Ronaldo horas antes da partida começar – que nos tivesse feito entregá-la em troca de qualquer favor idiota oferecido pela FIFA, Adidas, Nike, ou sabe-se lá quem, e, desta incapacidade de lidar com o óbvio, folclores e teorias sobre arranjos de resultados nasceram, mesmo fora do Brasil, afinal, o “grande time” que jogara “tão maravilhosamente bem” contra a Holanda nas semi-finais não podia perder como perdeu: apático, confuso, incapaz de reagir, e o problema de Ronaldo viraria desculpa para Zagallo, Bebeto e outros protagonistas do infame episódio na hora de justificar seus fracassos. Dunga, claro, seria exceção, e não hesitaria em enfatizar a relevância dos méritos adversários como elemento determinante do “desastre”. Desastre que, de algum ponto perdido no limbo esportivo, resolveu ressurgir, revivendo máculas e glórias de uma decisão até então questionada, talvez para desfazer mal-entendidos, remover nossas vendas de narcisismo ferido, castigar a empáfia de uma nação que só consegue analisar futebol olhando o próprio umbigo, repetir uma lição que nunca foi e dificilmente será aprendida, a lição de que estrelas nem sempre resolvem campeonato, de que ostentar um bom time transcende ter um plantel de craques, de que podemos possuir os melhores jogadores (será?), mas não necessariamente o melhor futebol, e de que este esporte também envolve estratégia, estudo, racionalidade, repetição, planejamento, treino, opções de jogo, prevalescência tática, física, emocional, de que “se deu certo anteontem e ontem”, não significa que ocorrerá de novo, de que se erramos e consertamos em cima da hora em alguns torneios onde triunfamos, não precisaremos errar outra vez para repetir a mesma “mística” vencedora.

Como em 1998, perdemos anteontem para um time mais inteligente, com uma estratégia superior à nossa, com um “maestro” intelectualmente mais capaz de compreender e manipular o jogo do que qualquer Kaká, Cafu ou Ronaldinho. Se capengamos e tropeçamos até a decisão de 98, sobrevivendo mais do talento individual do que de qualquer capacidade estratégica ou tática que Zagallo pudesse possuir na manga (ainda que proporcionássemos esporádicas exibições mais convincentes); em 2006, fomos além na mediocridade, e, de novo, os “azuis” de Zidane apareceram dos céus para mostrar ao Brasil que nosso suposto “melhor futebol do mundo” não pode mais sobreviver de improvisos, nomes, Marketing, brados, folclores, místicas, lampejos intuitivos e supertições, que se a alguns adversários sempre faltou o tal “brilho a mais” que fizesse diferença nos momentos decisivos, que se a essa mesma França faltara magia até anteontem e decerto faltará quando Zidane se aposentar, a nós carece inteligência, capacidade analítica, e, claro, fundamentos básicos de outras seleções onde atacantes sabem jogar sem bola e meio-campistas conseguem completar um passe longo e ligar contra-ataques sem grandes dificuldades. Isso, claro, sem mencionar nosso velho caos organizacional de bastidores futebolísticos, malogrado por ervas daninhas que usam o esporte preferido da nação como pretexto para enriquecer, vampiros da bola lucrando alto com cada transação, negociata escusa, patrocínio, saída ou entrada de jogador, mandando e desmandando dentro e fora do país, protegidos e legitimados pelo escudo dos clubes e federações que representam. O grande segredo de 98, revelado anteontem ao mais incrédulo dos incrédulos, pouco teve a ver com supostas convulsões de Ronaldo e certamente não envolveu qualquer entrega de resultado; o segredo foi uma mistura de talento e inteligência, de aliar qualidade técnica à estratégia, foi ter um amplo conhecimento sobre nós, nossos padrões, fraquezas, nossa terrível incapacidade de reagir e reorganizar quando surpreendidos e encurralados em nosso “modus-operandi”. Como em 98, o Brasil se deparou com um antídoto e não conseguiu se transformar ao longo de noventa minutos, ler a partida, utilizar opções, desenvolver alternativas sobressalentes para o caso de problemas com o “plano A”. Zagallo não tinha “planos B” em 98, e tampouco Parreira em 2006, apenas idéias vagas desenvolvidas ao longo do mundial, “pôr esse ou aquele jogador”, “um volante a mais ou um atacante a menos”. O segredo de 98 foi que apostar demais no jeitinho brasileiro pode nos fazer cair de joelhos ante a inexorabilidade racional dos europeus, especialmente se estiver ela aliada ao talento diferenciado de dois ou três jogadores, simbolizados anteontem por uma mistura de África com “Velho continente”, uma autêntica legião estrangeira pós-globalização encabeçada por general “Zizou”, seus tenente Henry e Vieira, sargentos Makelele, Thuram e Ribery, e todo um exército azul, branco e vermelho a marchar incólume sob o som da marselhesa enquanto enterrava cabeças verde-amarelas de mauricinhos e pop-stars sem comando ou qualquer noção do que ocorria em combate. Como Napoleão, Zidane fez seu exército dividir nossos apáticos representantes, isolá-los, anula-los no âmbito coletivo até torná-los quase inofensivos, atabalhoados, desesperados ante a morte anunciada. Não houve batalha, resistência ou honrarias. Fomos, como em 98, escurraçados da copa por nêmesis imbuídos em anunciar ao mundo que o futebol brasileiro era uma farsa. Se em Paris podíamos ser parcamente redimidos pela atuação satisfatória das semi-finais contra uma Holanda que nos sobrepujara por cerca de 70 minutos, perdera gols quase impossíveis, mas também nos brindara com um desgaste físico de prorrogação que ofereceria chances para mudarmos a imagem histórica de uma partida; anteontem, não houve atenuantes ou desculpas esfarrapadas, nenhum jogo anterior que nos consolasse, nenhum mistério que nos fizesse acreditar em conspirações folclóricas. Perdemos em campo e perdemos para o mundo inteiro saber da copa em que fomos um time de várzea, do mundial em que sucumbimos à arrogância da CBF, a uma preparação mal elaborada capaz de dispensar amistosos importantes para depois reclamar da falta deles quando o navio afundasse, a um grupo covarde, técnico e jogadores incapazes de contextualizar um problema e elaborar soluções ao longo de noventa minutos ou mesmo entre um jogo e outro. Parreira não perdeu porque quis jogar feio ou bonito; Parreira não adotou sua filosofia “pragmática” de 94, como tanto anunciaria a seus críticos, mas apenas a utilizou como pretexto para endossar vitórias fortuitas, quase casuais, onde estivemos a beira do gol de empate ou da derrota o tempo inteiro, gol que, por capricho e muito esforço dos pobres Dida, Juan e Lucio, não nos surpreendeu enquanto podia, deixando para aparecer justamente quando não mais fosse possível mudar, ousar ou arriscar. Se Parreira foi sensato ao colocar Juninho em campo, mesmo tendo esta escalação falhado além de minhas pobres e talvez enganosas expectativas, foi incoerente ao deixar Robinho por tanto tempo no banco, mesmo diante do óbvio, mesmo depois do gol, preferindo restabelecer seu time predileto com Adriano, talvez para calar a crítica com mais um golzinho espírita, prorrogando assim uma reação que poderia ao menos atenuar nosso vexame, garantir uma derrota digna ou até um empate em tempo normal, sucedido (Por que não?) de uma semi-final que nos possibilitasse enterrar Brasil X França de 2006 como Brasil X Inglaterra fez com Brasil X Bélgica em 2002, evitando que um erro de escalação marcasse uma era em nosso futebol, pois, em copa do mundo, o que ocorre durante 90 minutos de uma decisão ou ao longo de uma campanha, fica para sempre, acima de trocentos jogos de eliminatória, Copa das confederações ou comerciais da Nike. A humilhação de anteontem não sucedeu apenas por erros de escalação, mas coroou uma série de equívocos que permanecerão entranhados em nosso futebol, protegidos esporadicamente entre um título e outro, esquecidos a cada euforia e reavivados a cada comprovação de nosso eterno desleixo. Essa copa será marcada para nós como a copa da vergonha, a copa que humilhou nosso futebol como tanto temi ao longo de “reflexões” escritas neste blog, reflexões ingenuamente esperançosas de um milagre, mas profeticamente temerosas de um mico anunciado e confirmado. Esse time francês que nos venceu dificilmente voltará a brilhar como anteontem, pois, apesar da inesperada evolução que apresentara desde sua estréia, apesar de Henry e “Zizou”, ostenta ainda vestígios claros de mediocridade, que, mesmo diante de um oponente tão inexpressivo, mesmo diante de inquestionáveis méritos em nos sufocar por quase noventa minutos, ameaçaram reaparecer, e talvez reluzissem fortes, especialmente no pobre Barthez, se Robinho adentrasse o campo mais cedo, mas em futebol e na vida não existem “ses”, apenas a história, a irreversível história de um ovo fabergé que se estatelou e apagou o futebol brasileiro por quatro longos anos.

Perder é normal, mas não perdemos anteontem, fomos cuspidos do mundial pela porta dos fundos. E isso é vexaminoso!

Luiz Mendes Junior também escreve no blog:www.noticiasdofront3.blogspot.com

domingo, julho 02, 2006

A Copa inteira que poderia ter sido e não foi

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Daniele Pechi

Acabou! O tão esperado hexa não chegou e essa seleção brasileira foi uma das maiores decepções dessa Copa, não pela eliminação, mas pela falta de futebol.

A fase do mata-mata coloca todas as equipes em risco, mas esforço e superação foram palavras que passaram longe desse Brasil.

Deu até vergonha ver a seleção, com o time que tinha, se entregar diante da França. Depois das disputas acirradas que antecederam o nosso jogo, a Alemanha se superando para vencer a poderosa Argentina e Portugal, que com a ajuda de Ricardo, conseguiu vencer a disputa nos pênaltis contra a Inglaterra.

Eu diria que não foi uma surpresa para ninguém, pois essa eliminação estava mais do que anunciada: no decorrer de toda a participação do Brasil na Copa, esperava-se uma evolução que não aconteceu, a seleção marcou passo e só não caiu nas oitavas de final porque Gana era muito inferior tecnicamente ao Brasil. Talvez esse tenha sido o jogo de maior diferença técnica dessa fase.

Mais uma vez ficou comprovado que um bom time no papel não ganha nada! Uma equipe é muito mais que isso e pra esse Brasil faltou união, como teve a família Scolari em 2002; faltou vontade, não se via os jogadores tendo prazer de ganhar as partidas, faltou futebol, claro, o potencial que a seleção tinha, pelo menos no papel, era o maior de todos.

O grande problema é que fomos durante toda a Copa a grande “promessa”, a equipe que estouraria a qualquer momento, que na primeira fase não precisava mostrar tudo o que sabia pra passar, mas que continuou apenas sendo a promessa!

Ver o Dida tendo que dar chutão pra frente porque não tinha com quem jogar era deprimente. Jogadores tão experientes que já tinham participado de duas ou até três Copas dando as costas para fugir da responsabilidade? Esse era o Brasil que queria o hexa?

Renovar, mudar, tentar, poderia ter sido uma opção, mas as alterações feitas eram muito tardias, e óbvias. Claro que culpar somente Parreira seria uma observação inconseqüente, mas que tinha muita gente no banco querendo mostrar serviço e que não teve oportunidade, ou tempo, isso tinha!

Nem o mais brasileiro dos brasileiros nega que não foi só o Brasil quem perdeu, foi principalmente a França que ganhou, merecidamente. Zidane, que já tinha jogado muito contra a Espanha, mostrou que é gênio e vai deixar saudade pra quem teve a sorte de vê-lo jogando. Só não fez o gol, tarefa que ficou para Henry.

Afinal, em uma competição que só acontece a cada 4 anos, nada mais justo que vença a melhor seleção em campo, a que joga mais bonito! Se no futebol nem sempre isso é possível, parece que dessa vez tudo se encaminha para que tenhamos um campeão com méritos.

É, ficamos no papel, ficamos na França, ficamos na expectativa, ficamos esperando o Robinho entrar até os 30, 35 do segundo tempo... Ficamos mal-acostumados em chegar nas finais por três copas seguidas e ficamos aqui, esperando mais quatro anos por uma seleção que possa ser chamada de “melhor do mundo”.