sexta-feira, maio 26, 2006

Acima do bem e do mal

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Ricardo Stabolito Junior

Antes do treino da seleção brasileira na última quarta-feira, o repórter da ESPN Brasil André Plihal perguntou ao zagueiro Juan se ele havia assistido, no dia anterior, o amistoso entre Croácia e Áustria. O jogador foi taxativo ao responder não. Quando a pergunta foi direcionada ao lateral Roberto Carlos, o mesmo respondeu que havia assistido apenas ao segundo tempo da partida e, já se adiantando ao repórter, disparou: “Jogar contra a Áustria é uma coisa, jogar contra o Brasil é outra”.

A verdade é que o lateral tem certa razão. O Brasil é um time que está anos-luz à frente do selecionado austríaco – que sequer para a Copa se classificou. No entanto, o que fica evidente em sua declaração, assim como na de Juan, é uma notável indiferença quanto ao jogo. Essa indiferença seria aceitável se o time croata não fosse o adversário do Brasil na estréia da Copa do Mundo, daqui a cerca de 20 dias.

Na cabine de transmissão da ESPN, os comentaristas José Trajano e Fernando Calazans ficaram preocupados. Na sede do canal, em São Paulo, vários e-mails de assinantes criticaram a postura dos dois jogadores. O grande questionamento que surgiu a partir dessas declarações foi: até que ponto o favoritismo brasileiro pode ser benéfico?

Essa discussão já havia sido levantada antes da Copa, mas as declarações dos jogadores foi o primeiro sinal concreto de acomodação no período pré-Mundial. E a preocupação dos comentaristas tem motivos. Apesar de um time com peças individuais invejáveis e muito acima dos outros selecionados, em conjunto esses talentos costumam não apresentar um futebol tão vistoso quanto poderiam. O “quadrado mágico”, que deverá estar no jogo de estréia da seleção contra os croatas, encanta pelas possibilidades, afinal só esteve em ação 60 minutos no jogo contra Venezuela, ainda pelas eliminatórias.

Além disso, favoritismo nunca declarou campeão de torneio nenhum. Ter os melhores jogadores não quer dizer vitória certa, ainda mais quando vemos tempos em que o futebol é “infectado” pelo pragmatismo exacerbado. Diferente de 2002, que mostrava uma Família Scolari empenhada e consciente de suas deficiências, a seleção de 2006 parece cada vez mais pensar que está acima do bem e do mal, apostando em um Ronaldinho Gaúcho que sempre deixou a desejar na seleção, em um Adriano que vem em péssima fase desde o fim da temporada na Itália e em um Ronaldo que vem se recuperando de mais uma contusão – apesar de esse último ser um jogador comprovadamente de decisão, que em 2002 foi machucado para o Mundial e, mesmo assim, foi um dos grandes responsáveis pela improvável conquista do penta.

Portanto, apesar de ser, indiscutivelmente, a melhor seleção do Mundial, o Brasil tem que ter muito cuidado. Assistir a jogos dos adversários – conhecendo o seu adversário – é um passo essencial na preparação de qualquer equipe, da mais forte a mais fraca, principalmente no caso de uma Copa do Mundo, uma competição de “tiro curto”. Afinal, ninguém pode vencer um inimigo que não conhece, ninguém está acima do bem e do mal.

terça-feira, maio 23, 2006

E Beckham responde

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Henrique Moretti

David Beckham não os conhece. Nem deve ligar para o que eles falam. Tampouco sabe que eles existem. Mas eles enchem a paciência de nós, fãs brasileiros, nas transmissões esportivas dos principais campeonatos europeus. Quem são eles? Luciano do Valle, Muller e Mário Sérgio.

Os três integrantes do Esporte Interativo da Band, principalmente os dois últimos, caracterizam-se por uma grande má vontade com o astro nascido na terra da Rainha, o que enraiva o pobre telespectador de TV Aberta, aqui no Brasil.

Por vários jogos, os ex-jogadores e agora comentaristas Muller e Mário pegaram no pé do jogador do Real Madrid, fazendo suposições de mau gosto, perguntando-se onde está o futebol do jogador, que para eles não passa de marketing, e comparando-o com Marcelinho Carioca em uma enquete grotesca. A perseguição era clara.

Gostaria de saber onde estão eles agora, na semana em que David comprovou (como se precisasse) ser um dos jogadores mais regulares da equipe merengue, com uma brilhante partida na despedida de Zidane do Bernabéu, contra o Villarreal, onde serviu duas belíssimas assistências, e com outra grande atuação diante do Sevilla (dessa vez na despedida definitiva do craque francês), em que fez dois gols.

O fato é que David Beckham nunca foi muito querido nas terras brasileiras. Não sei se por ele ser considerado bonito, não sei se é porque é casado com quem é – Victoria Adams, ex-Spice Girl -, ou ainda por ser metrossexual assumido ou por ser o jogador de futebol que mais vende camisas no mundo e atacar de modelo. Dentro de campo, o motivo talvez seja porque sua qualidade parece ser mais fruto de treinamento duro do que dom divino (como se isso fosse um demérito), ou então pelo camisa 7 do English Team não apresentar dribles desconcertantes em seu currículo. Outros ainda consideram-no “amarelão” por causa da partida das quartas-de-finais da Copa de 2002, onde o Brasil bateu a Inglaterra por 2x1, de virada. Até parece que o Spiceboy foi o único culpado.

Mas na verdade a qualidade de Beckham é incontestável. Nascido em 2 de maio de 1975, em Leytonstone, Inglaterra, o jogador iniciou sua carreira no Manchester United, em 93, teve uma pequena passagem de 1 ano pelo Preston North, por empréstimo, retornando ao Manchester em 95. Estreou na seleção inglesa já em 96 e se transferiu para o Real Madrid há três anos. Em sua carreira, ostenta seis títulos da Premier Legue, duas da F. A. Cup uma da UEFA Champions League e um do Mundial Intercontinental, todos pela equipe inglesa.

A derrocada dos Red Devils está inclusive ligada à saída do seu antigo camisa 7 (desde que Beckham se foi, a equipe só conquistou duas copas nacionais), num fato que não pode ser considerado mera coincidência.

Apesar de não ter conquistado um título de expressão pelo Real Madrid (uma Supercopa da Espanha foi o máximo que conseguiu), o futebol do astro cresceu e amadureceu nos gramados madrilenhos. Lá, David ficou ainda mais completo, jogando por várias vezes em posição onde ele não estava acostumado, de volante, sacrificando-se em prol do time. Ele foi sem dúvida um dos únicos que se salvaram da má fase merengue, que se alastra por no mínimo duas temporadas.

Enfim, com os “jornalistas” brasileiros querendo ou não, o Spiceboy seguirá trilhando seu vitorioso caminho na Europa, onde é largamente reconhecido, e aumentando ainda mais sua popularidade na Ásia, onde é, literalmente, amado.

E será o capitão da Inglaterra na Copa do Mundo 2006, onde sua seleção é uma das favoritas ao título, o que abrilhantaria ainda mais a carreira do jogador de toque refinado, lançamentos precisos e cobranças de falta indefensáveis, que mesmo sem ter nada a provar para ninguém no Brasil e no mundo, mostra, em semanas como essa, um pouco do que ainda pode oferecer aos amantes do futebol.

Coluna também publicada em www.voleio.com