quarta-feira, abril 12, 2006

Erros e acertos de um surpreendente Noroeste

___________________________________________________________
Henrique Moretti

O Noroeste de Bauru foi a surpresa do Paulistão. Inesperada para muitos, mas não para torcida e mídia bauruenses. A combinação planejamento + dinheiro em caixa + salários pagos em dia sempre é certeza de bons resultados. E não foi diferente com o único time que representa a “cidade sem limites” desde a extinção do BAC (sim, aquele mesmo em que Pelé começou).

A chave do sucesso desse Noroeste que assusta chama-se Damião Garcia. O eterno dono da Kalunga, que patrocinou o Corinthians por longos anos, inclusive na conquista do Brasileiro de 90, chegou ao comando do Norusca em 2004. Com ele, a esperança no fim do túnel surgiu. Afinal, desde 1994 a equipe disputava divisões de acessos do Campeonato Paulista, e há dois anos na Série A-3 se encontrava.

Então, com melhorias na estrutura, no plantel de jogadores e boa injeção de dinheiro o time bauruense foi se reerguendo, terminando num bom terceiro lugar a competição a terceirona daquele ano, o que lhe deu o duro acesso à Série A-2. Dos jogadores de hoje, o plantel tinha o bom zagueiro Bonfim e o goleiro Maurício.

“Seu” Damião queria mais e o ano de 2005 foi definitivamente o que transformou o Noroeste de volta aos bons tempos. Mas a obscura segunda divisão do Paulista nunca é fácil e sua caminhada foi árdua, como não poderia deixar de ser. Começou com o técnico Juninho Fonseca, ex-Corinthians, que não durou mais de três jogos à frente do clube. Três expressivas derrotas bastaram para por em desconfiança o futuro de seu trabalho no clube. Seu sucessor foi Ivo Secchi, que foi por muito tempo auxiliar de Osvaldo Alvarez, o Vadão.

Ivo deu início a uma boa arrancada, que tirou a maquininha vermelha da lanterna do grupo e a levou para a quarta colocação, que garantia uma classificação para outra fase.

Porém, o técnico era considerado “teimoso” pelo presidente Damião e pelo gerente do clube, Celso Zisly, outro homem importante no reencontro do Noroeste com a glória, infelizmente morto num choque entre torcidas, na partida contra o Palmeiras, em Bauru. Essa teimosia refletia-se por exemplo na insistência de deixar o lateral-direito Tigrão, em boa fase, no banco de reservas, no grande número de volantes no time titular. O atacante Gileno, então ídolo da torcida, era constantemente preterido e ainda o meia Luciano Bebê, até hoje no clube, jogava mais recuado que de costume.

Assim, seu substituto foi Paulo Comelli. E a escolha foi mais que acertada. O treinador, que levou o eterno rival Marília à fase final da Série B do Brasileirão em 2003, soube-se aproveitar do bom momento do time e com uma equipe ofensiva levou o Norusca ao quadrangular semifinal, onde os dois primeiros atingiriam a tão sonhada vaga na elite do futebol estadual.

Porém, a defesa do time ainda era uma incógnita e o ataque cismava em perder um incrível número de gols. Assim, tropeços para São Bento, em casa, e Bandeirante, fora, foram inevitáveis. A partir da terceira rodada o Noroeste começou a mudar, e com duas vitórias seguidas pra cima do Mirassol, com destaque para o meia-atacante Luiz Carlos e o volante, hoje zagueiro, Edmilson, colocaram a equipe em posição priviligiada para na quinta rodada garantir o acesso, em cima do Bandeirante em Bauru, num Alfredo de Castilho abarrotado. Edmilson, novamente, foi o destaque do jogo, autor de um gol de falta.

O vice-campeonato frente ao Juventus não foi capaz de impedir a alegria dos bauruenses, que viam finalmente seu time de volta à Série A-1, após 14 anos.

Mas o ano ainda não havia terminado, e o Norusca fez bonito ainda na Copa Federação Paulista de Futebol, já sem o técnico Comelli, que acordou que só voltaria para a disputa do Paulistão e sem os destaques Gileno, negociado com a Ponte Preta, e Gilmar Fubá. A equipe conquistou seu primeiro título de primeira divisão, batendo o Rio Claro na final e conquistando vaga para disputar a Copa do Brasil de 2006.

Enfim, 2006 chegou e agora um Noroeste campeão impressionou. Comelli manteve a base, trazendo o goleiro Mauro (ao lado), o volantes Luciano Santos, o meia Lenílson e os atacantes Rodrigo Tiuí e Leandrinho, entre outros.

A equipe, mesmo sem muito tempo para treinar esse meio-time novo, obteve logo na primeira partida uma vitória contra o Corinthians, com o estádio lotado. É certo que houve a ajuda do auxiliar do árbitro Paulo César de Oliveira, que invalidou gol legalíssimo de Marcelo Mattos, mas o domínio do Noroeste na partida foi claro.

Provando que o resultado não foi mera coincidência, a maquininha continuou voando alto, com vitórias sobre equipes do interior, como América, Santo André e Ponte Preta, e apenas um tropeço diante do São Caetano, no ABC. À esta altura, o time já era líder, acompanhado por Santos e Palmeiras, mas considerado “cavalo paraguaio” por não ter enfrentado ainda os outros grandes, o que ocorreu na oitava rodada na Vila Belmiro, quando o Santos bateu o Noroeste por 1 a 0, numa partida que o resultado mais justo seria no mínimo um empate. Ali, a equipe da Baixada assumia a liderança.

Entretanto o Norusca não desanimou, batendo Paulista e Marília na seqüência e botando a liderança em jogo diante do Palmeiras, em Bauru (o Santos enfrentaria o Rio Branco na mesma rodada) no fim-de-semana.

No meio de semana ocorreria a estréia do time na Copa do Brasil, diante do XV de Novembro, no Sul do país. Aí ocorreu o grande erro na brilhante campanha noroestina. Comelli e diretoria, querendo “dar um passo maior que a perna”, que no caso seria conquistar o título da Série A-1, abdicaram da primeira partida pela competição nacional poupando a equipe para o jogo diante do Palmeiras, sofrendo um irreversível 4 a 1 que abalou as estruturas de um time até então com duas derrotas na temporada, e pelo placar mínimo.

Para piorar a situação, a partida diante da equipe de Emerson Leão não foi nada boa, com o Palmeiras abrindo dois gols de vantagem logo no início. Os destaques do Noroeste, como Cláudio, lateral-esquerdo, os meias Lenílson e Luciano Bebê, e os atacantes Leandrinho e Tiúi (na foto, frente ao MAC) cansaram de perder chances de gol, culminando com uma impressionante derrota por 3 a 1, depois de obter mais que o dobro das finalizações do adversário.

A fatídica semana tornou-se num verdadeiro marco para os noroestinos, pois ainda se somou a nova derrota, contra o Rio Branco, que acabou com as chances de título da equipe no Paulistão. A Copa do Brasil também estava distante, e nem mesmo uma vitória por 2 a 0 foi capaz de tirar a vaga do XV.

Era a hora da volta por cima, que surpreendentemente ocorreu. Vitórias sobre Guarani, Portuguesa Santista e Mogi Mirim deram novo ânimo à equipe de Bauru, que tinha como objetivo garantir vaga para a Copa do Brasil 2007 e a Série C do Brasileirão, de 2006.

Um empate com o São Paulo no Morumbi também foi um resultado a ser comemorado, e de quebra ainda complicou o Tricolor na briga pelo título, que ficou mesmo com o Santos de Vanderlei Luxemburgo.

Saldo da campanha noroestina: quarto lugar, melhor colocação na história da competição e título simbólico de melhor time do interior paulista. Ainda, boa média de público foi obtida, e bons valores surgiram no cenário nacional, tal qual os zagueiros Bonfim e Fábio (esse emprestado pelo Corinthians), o lateral Cláudio, os volante Hernani e Luciano Santos, o meia Lenílson e o atacante Leandrinho.

Agora, resta saber se o fôlego continuará alto por Bauru, e se o planejamento será adequado para o grande desafio da Série C do Brasileiro, tentando fazer frente ao rival MAC, hoje na B.

Para isso, o contrato de Paulo Comelli foi renovado, e o time agora precisará manter a base e encontrar bons substitutos para os que saírem, caso de Lenílson, acertado com o São Paulo, e de Luciano Santos e Rodrigo Tiuí (na foto, frente ao MAC), apalavrados com Coritiba e Palmeiras, respectivamente.

O “cavalo paraguaio” de Bauru assustou, acertou (errou também) e mostrou ser, enfim, original. A melhor equipe do interior paulista hoje espera manter vôos altos, e tenta, porque não, alçar viagens ainda mais atrevidas, rumo ao cenário nacional. Já deixou a impressão, muito válida inclusive para grandes clubes, de que com planejamento tudo é possível. E alcançável.

Nenhum comentário: