quarta-feira, agosto 16, 2006

Abelão sem vice

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Henrique Moretti

Não sou pontepretano, muito menos já morei em Campinas, mas desde 2003 admiro o técnico Abel Braga. Foi no Campeonato Brasileiro daquele ano que Abelão, como é conhecido, tomou uma atitude demonstrativa de grande caráter. Como muitos se lembram, no comando da Ponte Preta, o treinador foi um dos únicos a não abandonar o barco da equipe campinense no decorrer da competição, já que mais de 15 jogadores saíram acusando salários atrasados.

Mesmo sem receber, Braga honrou seu compromisso até o fim e superou as grandes dificuldades de trabalho, conseguindo manter a Ponte na Série A nacional, na última rodada, após vitória sobre o Fortaleza, em casa, rebaixando os nordestinos, e fazendo a festa da torcida da Macaca. E a imagem dos pontepretanos invadindo o gramado do Moisés Lucarelli para agradecer ao treinador foi muito marcante.

De lá pra cá, o treinador foi colecionando bons trabalhos e mesmo assim não conseguia sair do estigma de ser sempre vice-campeão. O que era meia-verdade, já que conquistou o bicampeonato carioca, com Flamengo e Fluminense, em 2004 e 2005, além dos vices - que o marcaram bastante -, da Copa do Brasil, com os respectivos times e nos respectivos anos.

Penso que um pouco desse estigma de Abel Braga vinha de preconceito por parte da imprensa, principalmente da paulista, que tem lá seus integrantes “bairristas”. O jeito do técnico - meio boleiro, sem papas na língua, e até mesmo boêmio – contribuiu para se criar uma imagem ruim, ou não tão boa, de Abelão. Frases marcantes, como a em que ele elogia indiscretamente a bandeirinha Ana Paula Oliveira, também contribuem para a formação da figura Abel.

Além do bi-vice da Copa do Brasil, seu Fluminense do ano passado rumava bem no Brasileirão, integrando a zona de classificação à Libertadores durante a competição inteira e apresentando por alguns momentos o futebol mais vistoso do país, porém o péssimo fim de returno fez com que a equipe caísse para a quinta posição, fazendo com que todo o bom trabalho realizado por Abel fosse por água abaixo.

Para superar o tabu de não se classificar para a mais importante competição das Américas sempre por muito pouco, o treinador resolveu encarar um clube já garantido na competição, e com uma belíssima estrutura: o Internacional. Mesmo Inter que ele dirigiu em 1989, quando caiu na própria Libertadores em sua reta final, depois de uma eliminação trágica ante o paraguaio Olímpia, em pleno gigante da Beira-rio.

E é em Porto Alegre que Abelão, aos 56 anos de idade, está atingindo o ápice de sua carreira. Porém como tudo na vida do carioca, o trabalho começou duro, e ele quase se viu demitido depois da “derrota” na final do Campeonato Gaúcho, para o rival Grêmio (a derrota vem em aspas porque o título foi perdido com dois empates na decisão, pelo critério de gols marcados na casa do adversário). A pressão da torcida colorada foi grande, e injusta, visto que a campanha na Libertadores e no próprio Gaúchão eram irrepreensíveis até então.

Fernando Carvalho, presidente do Inter, resolveu resistir à torcida, o que se mostrou a decisão realmente mais acertada, agora que ao visitar o Morumbi a equipe bateu o São Paulo por 2x1, ficando muito próxima do que seria (ou será) a maior glória da história colorada, o título sulamericano.

Título que viria também a coroar o trabalho do lutador Abel Braga, para dar um basta em todos os preconceitos e estigmas contra a sua pessoa, e mais, mostrar que quem vos escreve não errou ao colocá-lo como um bom postulante ao cargo de técnico da Seleção Brasileira, nesta mesma coluna, poucas semanas atrás.

Enfim, o treinador mais sincero do futebol brasileiro merece já há um tempo este lugar ao sol; não sou colorado, nem nunca visitei Porto Alegre, mas os torcedores são-paulinos que me perdoem, porque nesta grande decisão estou com Abel Braga e não abro.

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